sábado, 26 de fevereiro de 2011

O Sol e o Aço





17/02/2011
O Brooklin está quente hoje. A impressionante temperatura de 15 graus, coroada por um sol amigo que termina de derreter o resto de neve imunda, ainda amontoada em alguns cantos da calçada, alegra as pessoas e anuncia épocas de vôos altos e longos, sem medo do mau tempo. É assim que me sinto ao poder pedalar a minha nova vintage bike (presente de Valentine' s Day da minha princesa) sem congelar o nariz. Há dois dias atrás, pela primeira vez em NY, encarei o frio e me arrisquei numa corrida de 13 km no Central Park. O dia brilhante, de céu celeste, não amenizava as rajadas de vento que me rasgavam a espinha. Foi, porém, o meu primeiro contato mais íntimo com a natureza, em meio ao mar urbano em que me encontro, que purificou o meu sangue e a minha alma. A natureza é mais que tudo, é impossível detê-la, pude mais uma vez comprovar isso ontem. 

Com uma visão da metrópole insana de 360 graus, no observatório do Empire State Buiding, às 17:32, percebi os arranha-céus de toda a cidade desaparecerem diante da alucinante bola vermelha que se despedia e ia dar as caras um pouco mais a oeste. Foi um dos pores-do-sol mais incríveis que já presenciei: o contato da esfera fumegante com a tribo de aço delirante me deu a exata noção de como tudo que já existia sem a interferência de nossas mãos é imensamente maior e mais belo do que tudo que construímos com nossas arquitetura, engenharia e maquinaria. Isso, contudo, não me impede de apreciar a imponência de uma Manhattan erguida em meio a rios que a impedem de se expandir, mas não a impedem de se renovar e transformar. Tudo aqui cheira a metamorfose, as coisas se movimentam de maneira irregular, parece que vários universos vão se inter-seccionando e se misturando desordenadamente. E isso é fantástico, pois ninguém é o que parece ser, e o que parece por aqui pouco importa, nobody gives a shit, o que eu acho que é sinal de progresso.

E falando em progredir, a dupla dinâmica aqui já avançou bastante em relação ao projeto Fiftyflags. Adquirimos um livro fera que mapeia com riqueza de detalhes o que há de melhor nas estradas americanas: rotas, passeios imperdíveis, bons lugares para ficar etc. Temos também uma idéia do que vamos procurar em cada estado, além de sua bandeira. Mas sobre isso é melhor falar quando estiver acontecendo - cobertura em real time. Por ora vamos narrando nossas experiências em NY e os preparativos para a trip, que deve ter sua largada oficial lá pelo dia 10 de março, após uma rápida passagem pelo Caribe, a fim de renovar as energias no sol e no mar e o visto na imigração americana. Por enquanto, ouriçados com o porvir, cá na apple vamos aproveitando tudo de bom que ela oferece, desde o musical que te faz achar que os Beattles ainda vivem, até os malabarismos subterrâneos dos dançarinos de break nas interligações do metro. E vamos digerindo o frenesi que diariamente nos abofeta, e vamos tentando lembrar de comer alguma fruta vez ou outra, e vamos tratando de tocar em frente, pois uma viagem dessas é mais fácil de imaginar do que de realizar. Mas a nós não faltará coragem. E sobra cumplicidade, respeito e amor. É por isso que nada há de nos derrubar. Be truth!!! Be you!!!

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

E nasceu o projeto



06/02/2011


Green Bay Packers 31 x 25 Pittsburgh Steelers. No Brasil o comentário deve ser sobre o clássico Corinthians x Palmeiras, pelo empolgantíssimo campeonato paulista de soccer. Eu digo soccer, porque acabei de viver uma experiência totalmente football. Hoje, 6 de fevereiro, foi a final do Superbowl LXV, o evento esportivo mais aguardado e assistido nos EUA. Para se ter uma idéia, uma inserção comercial de 30 segundos em um dos intervalos do jogo não sai por menos de 3 milhões de dólares. A maioria absoluta dos anúncios foi de marcas de carro (Audi, Mercedes, Ford, Chevrolet...), mas o único que eu achei bacaninha foi o do Doritos. Grande porcaria, poderia ter sido sobre algum produto de que a raça humana está realmente precisando, como por exemplo ÁGUA. No intervalo o divertido mesmo foi o show do Black Eyed Peas - mais americano impossível. Vestidos robóticamente, com uma trupe de uns 500 dançarinos ensaiados, com direito a aparição subterrânea do Slash com sua guitarra fervilhante e do Usher descendo por uma corda para fazer uns passinhos de break, Fergie e seus amigos fizeram a alegria da galera presente no estádio. ShowBussines, baby!!

Enfim, comendo mozzarela sticks no pub One and One, na First Avenue esquina com a First Street, assistindo a um jogo cheio de estratégias, regras complexas e contato físico extremo e conversando com meus novos amigos me senti plenamente feliz. Por poder estar inteiro no momento, sem a mente poluída por pensamentos inquisitórios - por que, como, onde, quando -, uma vez que tenho respostas para todas essas perguntas. Como? De carro! Onde? Nos EUA! Por quê? Porque é a coisa que eu mais quero na vida. Quando? Agora!!! Vou traduzir em miúdos. Eu e minha amada vamos comprar um carro e viajar por todos os 50 estados americanos; pode incluir Hawaii e Alaska na lista. Vamos para, além de descobrir paisagens fantásticas e gente interessante, entender um pouco por que os EUA se tornaram essa enorme potência sendo um pais tão jovem quanto o nosso. E vamos, claro, para tentar absorver o que melhor tiver para continuar construindo a nosso trajetória de paz e amor.
Paz que, em NY tem a ver, sem generalizações, com money. Hoje, ao sair de nossa quebradinha no Brooklin, conheci um China que mal falava inglês, só o suficiente para fazer entender que procurava um apê (ou um quarto) para morar com toda a familia, e que ia comprar a lavanderia da esquina, cujos atuais donos, se não forem mexicanos, não podem ser nada muito diferente de porto-riquenhos. O lance é que eu pasmei: como um china desses, praticamente analfabeto in english, vai ter a manha de comprar uma lavanderia e fazer dinheiro? É claro que ele e a família vão morar em 6 cabeças num cubículo, mas o fato e que ele tem capital pra iniciar um negócio e disposição pra ralar que nem um louco. Eu fiquei me perguntando de onde é que ele tirou essa grana. Será que vendeu cabras na Mongólia? Ou será que foi com pirataria em Xangai? Sei lá, só sei que aqui é duro, mas tem pra todo mundo, se o cara é casca grossa pra aguentar a pressão. O China é, talvez eu não seja... Por isso é que eu vou pegar a minha gata e cair na estrada.

Falando na Cinderela, ela não estava comigo vendo o SuperBowl pois estava trabalhando em outro pub - que não tem tv, bem alternativo. O boteco Nublu, também no East Village, fica na avenida C, entre as ruas 4 e 5. A miss Simpatia fez uns bicos de bartender nesse bar pra levantar um trocado, enquanto ainda não sabia que ia rodar os States na barca nova do gatão. Enfim, era o penúltimo dia dela e eu fui caminhando as 7 quadras que separam os pubs no maior astral; só não saquei a camiseta porque venho aprendendo a domar meus cavalos, pois a temperatura amena de 0 graus não chegava nem perto de me intimidar. Cheguei lá e a pesquisadora já tinha levantado informações de como se faz para comprar um carro, para tirar driver license - a do Brasil só serve para carros alugados - e mais um monte de coisa. Ok, alguns obstáculos à frente, mas por que haveríamos de temê-los? Retroceder nunca, render-se jamais! E Viva la Revolucion! Nem que sea de tu alma...

Mas o high point da night foi meu camarada Zeb, um ítalo-americano de polo vermelha da Lacoste, bebendo um Jamenson atras do outro. Ele me explicou com apurada didática e incontida paixão o berço de nossa civilização na África, onde o ser humano não tinha sexo e comunicava-se através de telepatia. Disse ele que as disfunções comportamentais da raça e os atritos muitas vezes que dai provém são por conta de uma invasão camuflada de alienígenas, que semeiam a discórdia e promovem a barbárie. Bom, muita loucura para abraçar, mas acima de tudo ele é um espiritualista, assim como eu. E o seu discurso fabuloso, só um pouco prejudicado pelo hálito carregado de álcool e tártaro, me ganhou. Também acho que estamos destinados a não mais nos diferenciar por sexo e idiomas, mas isso vai demorar. Antes as fronteiras terão de se abrir, as raças se miscigenar e eu, homem, conhecerei o mundo ao lado da Christina, mulher.
See you, guys.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

The Beginning





05/02/2011


E cá estou em Nova York. Cercado de concreto, de gelo, de sacos de lixo e de ratos. É, meu irmão, essa também é a verdadeira Big Apple. As linhas do metrô jamais acabam; seu cheiro de mijo tampouco. Os táxis brotam do bueiro, são maioria absoluta entre os veículos que circulam nas ruas de Manhattan. Caminhões de bombeiros e ambulâncias com suas sirenes lancinantes também costumam aparecer bastante. Os automóveis amarelos são pilotados por gente do mundo inteiro, de paquistaneses a peruanos, de italianos a nigerianos. Mas isso quem me conta é a Chris, pois desde que estou aqui não consegui pegar um desses. Os carros estão sempre com passageiros, quando estão vazios não param nem fodendo; e quando param se recusam a nos levar aonde a gente quer. A saída é entrar no Subway, que funciona perfeitamente mas fede, ou caminhar numa friaça de - 5 graus. A Bisny já não é chegada num frio (fica com os dedinhos parecendo picolés), ainda mais com a garganta estropiada... A verdade é que andar na rua vira masoquismo, ainda mais se é nelas que você sobrevive. Porque aqui, pra viver bem mesmo, tem que ter grana. E não é pouca não. É claro que, como em qualquer grande centro urbano dos Estados Unidos, pra fazer compras é o paraíso. Mas como compras são a ultima coisa que me interessa, pra mim não faz diferença. Se bem que, sugado e mastigado pela bolha, não pude evitá-las.

Hoje eu ia trabalhar como garçon em coquetel num hotel chiquéééérrimo, coisa que, apesar das minhas habilidades e técnicas diferenciadas na BoquetaBar do Spot, já não estou mais com aquele animo todo de fazer. Enfim, o cara ia pagar 20 dólares a hora num trampo de 7 horas. Eu ia ganhar na faixa de 150 doletas o job, menos as tais compras que ferraram com a minha vida. Eu explico. Pra fazer esse trampo tinha que ter sapato preto, calca social preta, camisa preta, cinto social preto e gravata preta. E quem disse que eu trouxe essas coisas para Nova York? E quem disse que eu tenho essas coisas? Justo eu que quero passar o resto da minha vida o máximo de tempo possível sem roupa. NATURISM!!! 
Bom, mas já que ficar aqui e não voltar para o Brasil foi decidido e já que para morar numa caixa de sapatos a gente gastaria pelo menos 1800 dólares por mês - e até onde eu sei sou um cara desempregado -, toca comprar os "utensílios" do mais novo new  Manhatthan’s waiter of the year. O sapato e o cinto comprei na pechincha: 43 dólares os dois, tax included; a camisa e a gravata comprei na Banana Republic, porque comprar uns artigos vagabundos lá nos Chinatown não rola - já que vai ter que comprar, pelo menos compra alguma coisa decente. Enfim, os 98 da gravata e da camisa, mais 40 da calca da GAP, mais aqueles 43 do cinto e do sapato, tudo gira em torno de um total na base de mais ou menos 180 DÓLARES!!!! Pronto, já paguei 30 pra trabalhar...

Levando isso em conta, hoje, ao “amanhecer” no começo do entardecer, aqui no cafofo em que habitamos (sem janela ou qualquer tipo de luz, no porão de uma residência coabitada por mais quatro pessoas, no Brooklin), a mente foi clareando. Olhei pra Bisny, também afetada pelo "clima" gelado da cidade, e propus que a gente fizesse a única coisa que me pareceu sensata no momento: arranjar um carro e ir para a Califórnia, cruzando as famosas, ensolaradas e intermináveis estradas que cortam o país de Leste a Oeste. Portanto, de viagem marcada para a Califa, talvez em um breve mas benéfico impulso transgressor, resolvi dar o cano no rapaz bem arrogantinho que havia me contratado. Liguei uma hora antes do combinado, disse que tinha tido problemas particulares e estava voltando para o Brasil. Se o cara for bom mesmo, arruma outro facinho pra me substituir; se fosse no Spot, o Zé Barros arrumava com o pé nas costas.
Agora o mais louco de tudo isso é a maneira como a vida se movimenta. Vim pra cá a principio pra passar o meu mês de férias. Dois dias aqui e já tinha decidido que não voltava. Mais uma semana e a gente resolve que vai pra Califórnia de carro. Desse jeito, vou conhecer o mundo todo antes do que imaginava... Enfim, acredito muito que nossos sonhos e desejos nos impelem aos caminhos para realizá-los, a gente só não pode ignorar esses sinais. Antes de tudo, antes de conhecer qualquer coisa ou lugar, a gente tem que se conhecer um pouco. Boto fé que vou pra essa próxima etapa da minha vida um pouco mais sabedor de quem sou - apesar de saber que nada sei. E pronto para encarar mais de 5 mil km de estrada.