quinta-feira, 28 de abril de 2011

Cena punk




27/04/11

"Melhor ser morto por um tigre do que pelo sistema". Patrick Allen Jones, punk de Asheville, nosso host dos últimos dois dias, me disse isso ontem. Construtor de canoa viking, colecionador de carrinhos de cortar grama, entusiasta do halloween, tomador incansável de cerveja, infrator da lei e conhecedor de história. Isso é um pouco da personalidade peculiar de Patrick, que, junto de sua - também punk - esposa Cherry e de seu gato de três patas, nos recebeu com muita hospitalidade.

Vindos de uma temporada de mordomias na casa da Susi, com comidinhas saborosas todos os dias e lençóis cheirando à canfora, foi um choque aportar na punk house.  Na segunda-feira saímos de Davie às 5:22 da matina, depois de três mirradas horas de sono. Até nosso primeiro destino, em Suwanee, Georgia, foram mil quilômetros de asfalto. Tanta estrada assim faz a gente perder um pouco a noção de tempo e espaço, e quando retomamos essas percepções já estamos em um lugar completamente diferente, às vezes radicalmente antagônico, como foi dessa vez. Saímos da faixa litorânea da interminável planície que é a Florida, passamos pela Georgia embaixo de temporal só para pegar a bandeira e estacionamos em Asheville, cidade alternativa cravada no meio das Smoky Mountains. Mudou a paisagem, a temperatura, a cara das pessoas e o nosso leito: tivemos que dormir cada um em um sofá, cercados por bandeiras de caveiras. Não tenho do que reclamar, foi uma noite bem dormida. Talvez a Bisny discorde de mim nesse ponto...

Ontem pela manhã saímos logo cedo, fomos direto pegar a bandeira de NC e paramos para alimentação em um café no centro da cidade. Foi ai que comecei a reparar o que Asheville tem de especial. Nesse café não existe nada descartável, nem o potinho onde vem o molho da salada. O moderno mictório não necessita de água e o H2O da torneira é aquecido por energia solar. Caminhando por downtown, por onde quer que você vá não se encontra nenhum McDonalds, BurgerKing, Subway ou similar. Acham-se mercados de produtos orgânicos que estimulam a produção local e a gente deu uma boa percorrida pela área ciceroneados pelo Patrick, que nos surpreendeu ao nos mostrar o quanto entende de história. 

Houve um pequeno acontecimento na nossa viagem que não havia relatado. Em um posto de gasolina, usando a marcha ré, no intento de posicionar o automóvel para o abastecimento, uma falha humana do motorista fez com que as bicicletas, presas ao rack, colidissem com uma mureta. Uma grande expressão de desolação no rosto do condutor se formou quando este constatou o estrago nas bikes. Vinte e quatro horas depois entrávamos em um porão em Asheville, que pode ser descrito como um hospital de bicicletas e, mais do que isso, significa para muitas magrelas a ressurreição. Funciona assim: você escolhe uma das centenas das bikes doadas que repousam por lá e vai montando-a do seu jeito, usando praticamente só peças que também foram doadas. Para se ter uma idéia, no conserto das nossas foram usadas umas dez peças. O preço final disso tudo? U$5.00, pois a única peça nova foi uma correia. Os caras que trabalham lá são voluntários. O Jeremy, por exemplo, que deu toda assessoria para gente sair de lá com as bikes zeradas, tira leite de cabra no alvorecer e depois trabalha entregando sanduíches - de bicicleta, é claro. Uma vez por semana vai ao porão emprestar seu tempo e conhecimento para quem quer fazer uma bike se curar ou renascer. O espaço sobrevive só com donativos de quem acredita que esse tipo de iniciativa tem muito à contribuir para um modelo de sociedade baseado na troca e cooperação, que é muito popular em Asheville; até pelos punks e embriagados.

De noite rolou uma confraternização no jardim dos Jones, regada à cerveja barata e boa conversa. Ao que me parece esse é um habito quase que diário, uma vez que nas duas noites os vizinhos apareceram e participaram. O Michael, que é a cara do Thunder Bird, é o mais gente boa: quer viver 102 anos, dorme às  4h e acorda às 6h30 todos os dias (nem ele sabe como consegue) e é um cara muito inteligente, com uma puta consciência ambiental e social. O Patrick então nem se fala, fuma que nem um doido e guarda as bitucas no bolso; pega tudo que acha na rua e conserta. Falando com ele sobre meu sonho de construir uma casa na árvore, o doidão já veio com soluções auto-sustentáveis elaboradíssimas e me mostrou seu portfolio: uma máscara de papel mache, uma geladeira do horror do último halloween e um raft viking para descer o rio nos dias de verão. Além disso, ele guarda consigo alguns objetos bem ao estilo José Mojica Marins, como uma carcaça de raposa e as peles de alguns esquilos que degustou. Segundo a Bisny, junkie demais.

Mas na vida é assim, nem todos são santos ou demônios. As contradições são o que mais enriquece o ser humano, eu mesmo me perco, sofro e me delicio com as minhas centenas delas. Cabe a cada um extrair o que encontra de melhor em cada coisa. De Asheville saio com muitos aprendizados, muito material para reflexão e alguns novos amigos. A propósito: Patrick, estou te esperando no Brasil para a gente construir a casa na árvore, mas acho que vou pular aquela parte de comer um macaco, caso você não se importe.

Só para terminar, hoje pela manhã descemos alguns quilómetros até a Carolina do Sul para pegar nossa bandeira número 19. Fomos parar em uma residência que, nos fundos, funciona como loja. E fomos brindados com o sorriso e o carinho do Faust, bebezão que brincou um monte com a gente, antes de pegarmos o rumo da Virginia. Chegaremos em Arlington em duas horas. O FiftyFlags está em seu 20º estado e, quanto mais eu viajo, mais quero viajar.

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quinta-feira, 21 de abril de 2011

Aconchego!



20/04/2011


Como é bom estar em "casa"! Estamos em Davie, na Florida, na casa da minha prima, e aqui nos sentimos assim, à vontade! Família é uma coisa muito louca, né? Pelo menos eu fui criada em uma que valoriza termos o mesmo sangue... Da parte materna são 7 irmãs; 6 tias e muitos, muitos primos, todos criados bem próximos, ensinados a cultivar o amor e o respeito, defendendo e participando ativa e diariamente da vida uns dos outros. Claro que com esse número de pessoas acontece alguma confusão, mas posso dizer que são pequenas e insignificantes perto de tudo de bom que vivemos juntos.

O único dos primos que morou longe por muitos anos, mas que nem por isso ficou distante, é esse que tem família aqui; um cara incrível, que viveu intensamente seus sonhos. Por muito tempo ele quis que eu viesse visitá-los e agora eu vim, primo! Uma pena não tê-lo por aqui, curtiríamos muito esse lugar irado que você escolheu para morar; com lindas praias, um mar de águas claras e temperatura agradável, condomínios luxuosos com barcos estacionados no fundo do quintal, muito verde e qualidade de vida. Agora sei porque você não voltou... Tá certo! Posso te sentir aqui, feliz por eu estar com seus filhotes e sua linda mulher! Você faz falta.

Talvez por sentir tanta saudade de nossas famílias e por curtir estar aqui - praia todos os dias, sol, exercício, novela, filminho, comidinha deliciosa e muita tranquilidade - decidimos ficar até a Páscoa! Uma semaninha pra gente se curtir... Que ótimo! Coisa boa que é namorar... Ainda mais com esse gato que eu tenho aqui! Como ele me faz feliz... rs. Um príncipe-palhaço. Amooo!!

Estamos nos curtindo um monte, sem tanta correria; apesar que o trabalho nunca acaba. Hoje já levamos o computador para arrumar e ficamos na maior função para resolver o problema do rádio do carro, que resolveu pifar. Entre um mergulho e outro fomos atrás de alguém que arrumasse o rádio. Sem sucesso, fomos em busca da troca do carro. O que não foi de forma alguma ruim, já que o carro tava imundo e fedidinho. Fizemos tudo que queríamos, tomamos sol, brincamos no mar (que hoje estava com umas ondinhas e a água bem boa!) e também demos nossa corridinha na praia. Eu, na verdade, caminhei rápido, estou tentando entrar em forma novamente!

Sei que depois de um longo dia conseguimos um carro novo! Ueba! Dessa vez um Corolla verde, mais novo e limpinho. Levamos uma pequena "chamada", porque, juvenis, fomos à locadora com o rack da bike no carro... Qual o problema? Ele destrói a pintura, rs. Mas, sortudos, fomos liberados pela "vista grossa" da gerente! Aliás, hoje foi o dia da vista grossa: enquanto tentávamos resolver o lance do rádio, fomos parados por uma policial por estar acima da velocidade permitida, mas ela também foi legal e não nos multou. Dia de sorte; como a maioria dos nossos. 

Tirando tais probleminhas técnicos o Thi também já trabalhou na localização das bandeiras dos próximos  4 estados: Georgia, Carolina do Sul, Carolina do Norte e Virginia. Conseguimos também organizar nossa trip com os meus sogrinhos e conciliar o roteiro com a chegada da Naroca e do Thiago (dela). Minha amiga amada e seu namorido conseguiram tirar quase um mês de férias e como destino escolheram a Califa, nada mal. Assim que soubemos disso definimos nossa chegada à costa oeste na mesma data que eles. Faremos uma trip cheia de emoções e vários quilômetros... Vamos das montanhas ao litoral, de sul a norte e de norte a sul, passando pela divertidíssima Las Vegas! Acho que os pais do Thi estarão com a gente nesse ponto, pode imaginar?!? Sim! Vamos nos divertir muito! O Thi já está preparado pra ganhar 11 mil dólares no cassino, adoro!

Com os sogrinhos vamos fazer um passeio longo; do Colorado à California, passando pelo novo México e visitando alguns parques nacionais. Eles vêm com tudo! Preparados para aventura e muita caminhada. Isso é demais! Eles querem mesmo participar do FiftyFlags, então simbora... Mal podemos esperar...

Essa é nossa rotina, sem rotina nenhuma. Por enquanto essas são as novidades, nos falamos em alguns dias. Beijos e sorriam.

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sábado, 16 de abril de 2011

Sons of Illusion



15/04/2011


Estou extenuado, esgotado, com menos de um fiapo de bateria, só o suficiente pra escrever estas linhas tortas e dormir aliviado o sono dos justos. 

Ontem, ao deixar Panama City Beach, eu já vinha com uma certa sensação de cansaço. Lá a gente pegou dois dias de sol pleno, crepúsculos estonteantes, temperatura agradável e muita praia. A areia da praia, que é banhada pelo Golfo do Mexico, é bem branca e fininha, perfeita para se esparramar. Se não fossem os prédios estilo Riviera de São Lourenço eu diria que o pico é top. Mesmo assim é muito bonito.

O Jeff, nosso host, que nem bem desembarcamos armou uma festinha no apê, é completamente pirado, mas muito, muito gente boa. O cara é quarentão, capricha nos trajes - no dia da festinha fez umas cinco trocas, no mínimo -, toca bateria, tá aprendendo a tocar guitarra (comprou logo cinco) e foi muito carinhoso com a gente; prometeu até que vai se agregar à caravana do Burning Man. Eu boto fé. Ele tem três filhos e é o maior paizão. Na última noite todos dormiram lá na sala da casa, que tava nos trinques no dia de nossa chegada e virou uma celeuma completa.

Mas dizia eu que, no dia em que partimos, já vinha sentindo um certo cansaço, não conseguia acordar cedo, demorei pra arrumar as coisas, a Bisnaguinha também estava com cólica… Sei lá. De repente, sem mais nem menos, deu um aperto no coração na hora de me despedir do fera que eu desatei a chorar. É muito maluco esse negócio de ficar na casa de uma pessoa que nunca vimos, começar a fazer uma amizade e, depois de três dias, já ir embora pra outra casa, com outra pessoa totalmente diferente que também te cativa, sabendo que dali a outro par de dias vai deixar aquela historia que nem bem começou pra ser terminada, quem sabe, numa outra ocasião.

O Jeff ficou e a gente tocou rápido pra Celebration, que fica ao lado de Orlando e da Disney, porque, além da enrolação pra sair, descobrimos que o fuso horário nos brindava com uma hora a mais de presente. De Celebration e da Dri, nossa host, que é brazuca e um amor de pessoa, vamos falar depois, uma vez que ainda passaremos por aqui, na volta de Miami e Key West. Eu quero é FALAR DA DISNEY!!! Daquele parque do qual o Mickey é patrono e onde pra peidar tem fila.

A Bisny tinha vindo pra Disney com 14 anos e, por razões teen, não conseguiu aproveitar direito. Com o dobro da idade, queria voltar à fábrica das fábulas e se matar de tanto se divertir. Eu, que já vinha com a tal citada sensação de cansaço, acordei podre hoje e estava zero empolgado pra curtir com Donald e Pateta. Porém, rapaz psicanalizado que sou, tentei girar o botão e entrar na onda. A primeira punhalada veio na bilheteria: $ 289,00 pra visitar Magic Kindon e Epcot Center. No fim, até que isso não foi mal, porque, se a gente tivesse gastado cem dólares a menos mas fosse só ao Magic Kindon, a decepção teria sido maior. A proposta do Epcot é legal, tem a ver com o planeta, sua preservação, a união dos povos… Mesmo assim eu preferiria assistir quatro horas de National Geographic.

Pra gente, essa não é uma viagem só de lazer. Temos objetivos e projetos e, além de termos contado com uma ajuda dos coroas, empenhamos todas nossas economias nessa empreitada. Matematicamente falando, significa que temos U$100,00 por dia pra gastar. U$20,00 são do aluguel do carro, sobram U$80,00. Um dia intenso de estrada e isso vai só de combustível. Tem que comer alguma cosia e tal, já estourou. Daí a gente tem que compensar nos dias em que paramos em algum lugar. Em Panama City Beach deu pra fazer isso, o que equilibrou a contabilidade, só que a Disney hoje explodiu com tudo. Mas não estou chateado nem arrependido, a Bisny, tadinha, é quem está, ainda mais porque hoje eu não estava nos meus melhores dias e não dei aquela minha costumeira animada no reggae. Ela está aqui, dormindo ao meu lado, e eu queria que ela tivesse um sono tranquilo, que seus sonhos contassem o quanto acho ela uma mulher maravilhosa, inteligente, sensível, carinhosa, carismática e talentosa. E queria também jurar amor eterno, pedindo desculpas por não ter sido tão agradável hoje. 

Mas queria também, antes de terminar, falar mais um pouquinho da Disney. Será que, se todas aquelas crianças, ou melhor, os pais delas, abrissem mão de 30% de todo o dinheiro gasto com Aladim, Cinderela e Branca de Neve, ou com qualquer outro similar, e revertessem essa verba pra alimentar as crianças necessitadas da África, Ásia e da America Latina, muitas vidas não seriam salvas? Será que é mesmo fundamental uma criança crescer se lambuzando com chocolates e guloseimas em forma de personagens? Será que esses infantes sadios e corpulentos não poderiam crescer sabendo que, enquanto eles se refestelam com amenidades, a muitos falta o básico? Será que a Disney não poderia reverter integralmente a renda de dois de seus parques aos refugiados do Sudão? Não quero fazer aqui o papel do revolucionário falastrão, pois se realmente penso tudo isso não deveria nem ter pisado na Disney. Tampouco quero desvalorizar o sonho e a fantasia, que estimulam e alegram a imaginação de uma criança, que não tem culpa nenhuma de tudo de absurdo que assola a humanidade. Faço essas perguntas pra mim mesmo, porque tenho bem claro meu objetivo, que é viajar o mundo inteiro pra poder refletir com um pouco mais de propriedade a respeito dele. Talvez, quando eu vir de perto o mar de sofrimento que sei que existe por ai, isso me toque e eu dedique minha vida pra ajudar a mudar essa situação. Talvez eu veja todas essas mazelas com meus próprios olhos e não faça nada. Talvez eu seja mais um filho de Walt Disney e constitua minha família nessa ilusão. Talvez eu possa transformar o mundo. Talvez...


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terça-feira, 12 de abril de 2011

E assim chegamos à Florida




12/04/2011

O dia acaba de começar pra gente em Panama City Beach, Florida. Esta é uma parada que foi estrategicamente programada para fins laboriais. Como estamos vindo de uma sequência bem intensa de passeios e pessoas, achamos que estacar  aqui por alguns dias seria uma boa oportunidade para colocar em ordem todo  o nosso material e as nossas idéias. Ainda é um pouco cedo pra dizer, pois chegamos ontem à noite, mas pelo pouco que vi não tenho tanta certeza assim se esse é o ambiente mais indicado para encontrar a tranquilidade. Bom, mas em relação às instalações não temos do que nos queixar: nosso quarto e banheiro privativos, uma estrutura de hotel e uma praia nos esperando a 50 metros. Mas não vou me estender agora nos relatos de uma passagem recém iniciada, isso é assunto para o próximo post. Vou adiantar apenas que o Jeff é um dos caras mais pirados que conhecemos até agora.

Depois do Big Bend National Park, eu e Bisny já rodamos um tanto. Dormimos uma noite em San Antonio, na casa do Ivo, um couchsurfer poliglota gente fina, com um coque muito bem compacto e um sapato de couro de jacaré. Chegamos lá perto das nove da noite e ele nos levou a um restaurante bem americano, onde, ao som altíssimo de Rihanna, eu e a Chris, vindos de silenciosa passagem pelo deserto, quase tivemos um colapso cerebral ao tentar acompanhar a conversa em inglês e italiano do Ivo e de mais três amigos dele, que iam e vinham até a mesa. Da cidade de San Antonio mesmo, não conhecemos nada, lá é tudo muito espalhado, só deu pra conferir o lifestyle de mais um doidera que cruzou nosso caminho.

Até New Orleans seriam mais de 800 km, nada que nos assuste, mas o problema era que até alí só tínhamos lugar para ficar naquela sexta-feira e o nosso projeto era ficar por lá o final de semana inteiro. Mas é impressionante como, de um jeito ou de outro, as coisas se ajeitam. No meio do caminho, recebemos a mensagem de um brasileiro, que até então tinha dito que não poderia nos receber, nos convidando para ficar na casa dele. Pronto, pendências resolvidas, a viagem transcorreu tranquila até aterrisarmos em Metairie, cidade ao lado de NOLA onde o nosso amigo Rafa mora. Grande garoto, diga-se de passagem...

Na própria sexta à noite demos um pulo até o French Quarter pra ver o movimento e comer alguma coisa; logo de cara New Orleans nos surpreendeu. A famosa Bourbon Street que encontramos pouco tinha a ver com a que imaginávamos. Aquela imagem de cidade artística, berço do jazz, logo veio à lona quando vimos a multidão de universitários segurando drinks fluorescentes e pulando de bar em bar - mais uma vez - ao som de Rihanna. É claro que, como comprovamos nos dias seguintes, o jazz ainda sobrevive por lá, mas a impressão que tive é que reina mesmo a bagunça, não importando como é que se faz pra bagunçar. E o Rafael, molecaço de 23 anos que arrumou um estágio em uma empresa nessa balbúrdia, é mestre nisso. Vou contar no que esse rapazinho me enfiou no sábado de manhã.

NOLA é uma cidade universitária, as sedes de Tulane e Loyola ficam bem ao lado, na área que eles chamam de Up Town. É uma região da cidade bem bonita, com bastante verde e casas enormes, com arquitetura espanhola e francesa, os países aos quais o estado de Louisiana pertencia antes de ser anexado aos EUA. É uma vizinhança muito agradável, mas os jovens abonados que vêm de toda a parte do país para estudar em NOLA transformam os casarões em repúblicas estudantis da pior espécie. Foi em uma dessas que nos encontramos com os amigos do Rafa para a concentração da beer marathon, prova maluca onde a equipe de 10 pessoas tem que beber 25 cervejas e correr uma milha por quatro vezes; ou seja, é um ato totalmente insano. Não fosse a minha bagagem de 28 anos de pista (bebi três na hora da largada pra impressionar e depois joguei todas as outras, no mato, na privada e na torneira - é claro que essa competição esdrúxula não tem juíz), eu teria vomitado as tripas como a maioria dos meus colegas de equipe. Nessa hora valeu a quilometragem: saí de lá inteiro e coroado M.V.P do time.

A nossa sorte é que bem neste final de semana estava rolando na cidade o French Quarter Festival. Vários palcos foram montados em diversos pontos do French Quarter e rolou uma sonzeira de qualidade, gratuita ao público, que dançou, se divertiu e ouviu música da melhor espécie. Eu e a Bisny aproveitamos um monte, mas ficamos com aquele gostinho de quero mais. Fazer o quê, sempre chega a hora de partir. Saí de New Orleans um pouco decepcionado. Não com a cidade, mas com a constatação de que cada vez mais as pessoas consomem produtos descartáveis, sem raízes e sem conteúdo. Mas não sou ninguém pra julgar o que o outro faz, só posso assinar pelas minhas escolhas, e se não fosse o grupo de garotos negros que fez uma multidão parar no domingo à noite pra vê-los tocar apaixonadamente numa esquina qualquer, eu diria que NOLA não seria um destino ao qual voltaria. Quem sabe?

Só sei que agora estou na Florida, indo pegar uma praia. Nossa viagem até aqui foi mamão com açucar, ainda passamos por Gulfport, Mississippi, e Mobile, Alabama, para pegar as bandeiras desses estados. Com isso ganhamos tempo e poderemos aproveitar com mais calma lugares mais interessantes. Nada contra os digníssimos estados do Alabama e Mississippi e sua gente simpática, mas como essa viagem tem data pra acabar temos que fazer escolhas. Para poder cruzá-los rapidamente, a gente teve que gastar algumas horas pesquisando na internet lugares que não fugissem muito da nossa rota e que tivessem as bandeiras dos estados. A do Mississippi, por exemplo, não foi nem em uma loja que achamos. Eu encomendei com uma mulher que faz banners e bandeiras uma semana antes e nós nos encontramos no estacionamento de um shopping em Gulfport. Tá pensando o quê, que é só sair viajando que se encontra tudo pelo caminho?!

Chega, beach right now! Até.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Arribaaaa!!!!




07/04/2011


Vou aproveitar o cenário espetacular e, mesmo não tendo aptidão estomacal para escrever com o automóvel em movimento, relatar os nossos dias estupendos no Big Bend National Park antes de chegar à civilização novamente.

A parte oeste do Texas, que faz fronteira com o Mexico na região desértica do país latino, é vasta, árida e quente. Os termômetros estão marcando 40 graus fora do carro. Eu não sou muito de abusar do ar condicionado, ambientalmente não é legal e prefiro a sensação da temperatura natural, mas hoje não fui cowboy o suficiente pra sugerir à Bisny uma viagem caliente. Nem adiantaria, ela adora fazer minhas vontades descabidas, mas sabe muito bem me colocar no meu lugar. Ah, como eu amo essa menina...

Falando em cowboy, o que mais vimos pelo camping, além de adoráveis e ativíssimos casais da terceira idade, foram rústicos gringos: acampadores profissionais e motoqueiros, entendedores de mecânica e tomadores de cerveja. Foi um desses, que dormia em cima da mesa de piquenique para ver as estrelas e roncava como um trator, que fez uma inspeção no nosso corolinha e não constatou nada de errado. Outro, agorinha mesmo, no posto, me ajudou a calibrar os pneus devidamente. É, rapaz, aqui no Texas a maquininha não apita quando o pneu tá bom, tem que ter um medidor especial, que o cowboy logo sacou da caçamba entulhada da caminhonete - estamos nas terras das caminhonetes, nunca vi tantas.

Deixando um pouco de lado esses detalhes operacionais da viagem, vou falar do que mais importa, o parque. O Big Bend tem 3.242 Km2 e é a maior área de conservação do deserto de Chihuahuan. O parque é formado basicamente por planícies áridas e montanhas (Chisos Mountains). Nós acampamos na planície, perto do Rio Grande, a única área com um pouco mais de verde na região. Nas montanhas também tem um pouco de verde, mas é tudo muito seco, pedregoso. Para se ter uma idéia do quanto seco é o clima, esse ano ainda não caiu uma gota por lá.

Nós passamos três dias e meio fazendo trilhas, tirando fotos e nos conectando com a natureza. Em um ambiente como esse tudo muda no estado de espírito. A gente só comeu coisa saudável, praticou yoga todos os dias, fez um monte de exercícios e caminhou sem piedade. Saio daqui muito mais alinhado com meu corpo e com minha mente - fiz funilaria, pintura e ainda joguei um brilho. 

Agora é tratar de manter o ritmo até começo de maio, quando vamos fazer um mês inteirinho só de parques nacionais, um na sequência do outro, lá por Wyoming, Idaho, Utah e Colorado. Tudo vai ser uma preparação para o enfrentamento com um urso no Alaska, que estou agendando para agosto. Hah, até parece, né!? Eu sou um puta de um cagão. No Big Bend existe uma pequena população de ursos (pretos, bem menores do que o pardo gigantesco do Alaska) e leões da montanha, que, ao que consta, têm medo dos humanos e sempre os evitam. Eles ficam na área das montanhas e, apesar de conseguir controlar o medo usando a razão, fiquei adrenalizado ontem antes de fazermos uma trilha por aquelas bandas. A Bisny, bem valente, tava toda descolada, mas depois, já no carro, quase se borrou quando um veadinho, da espécie dos ainda sem chifres, chegou perto da janela. Não vimos nem leão nem urso, mas deitamos no topo da montanha, fechamos os olhos e sentimos o sol penetrar na nossa pele ao som da melodia dos ventos.

Eu já disse acima que o parque faz fronteira com o México, só o Rio Grande, que tá mais prum riacho seco, divide os dois países. Em nossas andanças pelo deserto, diversas vezes vimos alguns artesanatos locais ajeitados em alguma pedra, com um bilhete ao lado, em inglês é claro, com os preços de cada objeto e um sagaz God Bless You no fim, mais um potinho para o comprador depositar os dólares. Fiquei impressionado com a maneira que os mexicas inventaram de ganhar um trocado a mais. Viver por ali deve ser cruel, é areia e cacto que não acaba mais, você anda, anda e tudo continua igual. O céu é azul, mas ao horizonte parece nublado, de tanta areia que sobe na secura do Chiuahuan. O lugar é maravilhoso, mas viver sob essas condições, inalando pó o tempo inteiro, deve ser duro. 

Enfim, o que eu mais queria era encontrar um desses cangaceiros del deserto para trocar uma idéia. E não deu outra. No Boquilla Canyon, onde o rio é especialmente raso, avistamos uns 3 caras trabalhando ali, logo ao lado, no México. Depois de uma conversa aos gritos, em portunhol, um deles atravessou e veio falar com a gente. Obviamente ele queria vender alguma coisa, mas como não tínhamos nenhuma plata teve que ser na base do escambo: acabei levando uma pulseira pra Bisny em troca de uma caneta e um fone de ouvido. Fico pensando no itinerário dessa caneta, que foi presente de um cliente para os garçons do Spot, e que agora escreve ofertas de artesanato local para gringos trilheiros no povoado de Boquilla. Doido, não?...

Então, o cenário ainda não mudou, o Texas continua ermo e o celular não pega. Nosso host lá em San Antonio deve estar esperando um sinal. Esse cara deve ser figura, já viajou de sofá em sofá uns 70 países do mundo e logo mais está de mudança pro Brasa. De qualquer maneira será um contato breve, porque amanhã bem cedo já partimos para New Orleans.

So guys, that is it. Vou pegar o volante, que a minha MOMO (mochileira/motorista) já tá guiando há umas três horas. Deixo pra vocês muitas energias positivas, muitos beijos e abraços. Hasta Luego!


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domingo, 3 de abril de 2011

A cidade hippie que brotou no Texas



02/04/2011


Texas! Imaginava que seria bem interessante, mas não esperava encontrar um lugar como esse, Austin! Já é um dos meus lugares preferidos, o melhor desde o começo dessa trip, com certeza.

Sabe aqueles filmes legais que mostram pessoas felizes, vivendo da arte e da música, onde a natureza é abundante, tem piscina natural com água que brota da terra, tem verde e passarinhos e faz sol sempre?... As pessoas são felizes, é possível sentir A FELICIDADE, ela é quase palpável! Eu me sinto feliz aqui, muito feliz e posso ver a felicidade do Thi também.  Austin é assim, uma cidade de filme.

Desde que chegamos, depois de 9 horas de estrada, foi só festa, literalmente. A primeira parada foi num bar, festa dos CSers. Ainda não tínhamos um lugar certo para dormir, mas sabíamos que achar um sofá ali não seria problema. E foi assim mesmo, conhecemos um monte de gente, de todo tipo e lugar, e recebemos alguns convites de estadia (estamos fazendo sucesso com o fifty, as pessoas adoram!). O Thi logo fez amizade com dois meninos de NY que estão morando aqui. Os caras bem legais, molecões de tudo; um músico (brett@brettrandell.com) e um aspirante a soldado da paz.

Estamos aqui, no apartamento deles (uma bagunça típica de moleque). Depois da festinha no bar viemos pra casa, exaustos. No dia seguinte fez um solzão, uns 30 graus. A gente nem acreditava, que delícia! Porém, ficamos o dia todo por aqui mesmo, trabalhando no fifty. Fim de tarde fomos à uma loja digna dessa cidade: Lucy in Disguise with Diamonds (www.lucyindisguise.com). Uma loja de fantasia que tem de tudo, mesmo. Fomos comprar máscaras para a festa que íamos à noite. O Thi parecia criança em loja de brinquedo... Ficou louco por aqueles acessórios todos! Comprou até um colete prateado (aliás, esse colete tá me dando trabalho... Lindo como ele é, já chama atenção, imagina com esse colete?!).

Aqui cada um anda como quer, faz o que quer, tatua onde quer, pede pro pedestre que tá atravessando a rua fazer um high five... Uma cidade especial, livre de julgamentos. Austin foi o lugar escolhido pelos hippies para formar uma comunidade livre das antigas tradições texanas. O resultado foi esse, uma cidade alegre, jovem e viva! Um tanto quanto maluca, é claro, imagina um monte de gente orgulhosa por poder pirar sempre que der na telha? 

A festa de máscaras foi assim; loucura total. Ficamos até um pouco deslocados... E olha que a gente tava super no clima, de máscaras e coletinho!

Até a aquisição da bandeira foi mais legal aqui. Fomos comprar um snack pro Kobe, um dos nossos hosts, num posto de gasolina decorado com bandeiras. Achei que valeria a pena perguntar se eles, por acaso, vendiam bandeiras também... E eles vendiam! Imagina só: descemos os quatro do carro, de máscaras e fantasias, pegamos a bandeira fazendo a maior festa, dançando, tirando fotos, filmando... Foi muito legal; as pessoas no posto se divertiram! Só maluco...

Hoje o dia foi delicioso, de manhã fomos comer tacos especiais para café da manhã. Aqui existem vários trailers que funcionam como restaurantes, tudo ao ar livre, embaixo de árvores, uma delícia! Depois pegamos uma trilha até Barton Springs, onde nadamos nas águas naturais e tomamos sol com uma galera esticada na grama, pulando do trampolim, nadando com seus cachorros... Bem hippie mesmo. Coisa de filme! Na sequência passeamos por uma feira de arte, bem interessante, mas cara pro nosso bolso (no momento, rs) e fomos almoçar no cinema! Assistimos a um filme "non sense" e comemos esparramados num sofazão!

Pra finalizar assistimos a um show excelente, de um amigo do Brett, nosso outro host. Que show! Violino, sax, baixo, violão, voz... Tudo com muita qualidade! Incluindo o lugar, a céu aberto, super cool, como eles dizem.

A cidade tem um slogan interessante: "keep Austin weird". É a mensagem perfeita para este lugar. Tomara mesmo que essa ENERGIA HIPPIE permaneça por aqui eternamente. Nós iremos voltar!