sexta-feira, 27 de maio de 2011

Odisseia



26/05/2011


Você já ouviu falar em Bismarck, ND? Eu nunca. Até que, procurando pela bandeira de North Dakota, descobrimos uma loja lá; assim sendo, recorremos ao nosso querido CS. Queríamos saber como é morar nessa cidade e comprovar, mais uma vez, que existem couches por toda a parte. 

Dito e feito, conseguimos um sofá para aquela noite, no apartamento, de muito bom gosto, de um arquiteto recém formado; deixamos o Bandlands ainda com um tempo esquisito e dirigimos pra lá. Da cidade vimos pouco; jantamos em um pub bacana e seguimos de volta ao apartamento em um passeio a pé. Vimos que a cidade é realmente pacata e que o legal mesmo é se reunir com os amigos. Ficamos horas trocando ideia com três garotos da região, dando boas risadas e intercambiando muitas dicas de viagem. Os meninos são do couchsurfing e já viajaram um monte… Um deles já passou por 48 estados norte americanos e talvez vá com a gente para o Alaska (um dos dois que faltam em sua lista).

No dia seguinte,  procurando por lojas de bandeiras em Wyoming, tomamos café da manhã numa lanchonete bem típica, daquelas americanas dos anos 60/70. E partimos em busca de nossas bandeiras! Como vocês sabem, encontrá-las aqui nos estados do Midwest não tem sido tarefa fácil. A de ND compramos com um cowboy que nos encontrou no mall da cidade. A de Montana nos aguardava numa casa à beira da estrada; e a de Wyoming… Bom, essa tivemos que apelar! Foi comprada em Montana mesmo. Mas com certeza esse estado não ficará de fora, o Yellowstone nos aguarda em agosto.

Esse dia foi uma odisseia, como bem disse o Thi. Dirigimos 1200 km… EMBAIXO DE CHUVA! Não tivemos trégua nem por um segundo. Passamos por lugares magníficos, rios com muita água e montanhas ainda com neve. Pena que já era noite e que a pista estava um sabão! Foi tenso. Nosso muito obrigado ao Skank, que pela segunda vez nos manteve acordados e cantarolando seus hits até o motel onde dormimos.

Idaho Falls foi nossa parada. E lá pegamos nossa bandeira de número 40!!! Uau, isso tá indo rápido… O dia tava bem mais bonito, com sol e temperatura agradável. Curtimos o dia por ali com um belo almoço e umas horinhas de bom papo, jogo de basquete e brownie na casa da mulher que nos DEU "the Idaho State Flag"! Quanta surpresa boa nos aparece, foi tudo tão intenso que vamos ficar na casa dela quando voltarmos pra visitar o Yellowstone (já que uma parte do parque fica em Idaho).

Felizes - depois de um dia renovador, que teve um momento importante de cumplicidade e boa conversa, seguido de massagem que fizemos com um casal china (nossa que dor!) -, seguimos pela estrada, leves, livres e soltos… Dessa vez foram só quatro horas até a casa da amiga do Thi em Salt Lake City, Utah. Detalhe: lá ainda tem estação de esqui aberta! Comemoramos o niver de um amigo dela num pub (o único aberto até ás 23 horas) e demos uma voltinha na cidade. Dormimos super bem e logo cedinho viemos para o Brycecanyon National Park! Vamos passar os próximos cinco dias acampando de parque em parque (Brycecanyon, Canyonlands e Rockymountains).

Amanhã é niver do príncipe… Eu queria fazer algo bem legal, quebrei a cabeça pensando e me dei conta de que, aqui, cercados pela natureza, o melhor seria o mais simples. Comprei uns presentes que ele ainda não viu, teremos café da manhã com picnic, massagem no fim de tarde (dessa vez eu mesma vou fazer), jantar depois do pôr do sol e fogueira com vinho pra finalizar a comemoração! Tenho certeza que, do jeito que estamos, em total sintonia, será um dia bem especial! 

É quase meia noite aqui… Vou lá abraçá-lo bem forte e desejar que ele seja muito FELIZ, sempre! Parabéns, príncipe encontrado, eu amo você.

domingo, 22 de maio de 2011

Da lama ao caos.



22/05/2011


E chove aqui no Badlands National Park... Ontem nós atravessamos o estado de South Dakota, nosso 36º, na intenção de aproveitar um domingão selvagem e explorar essa região que é bem bonita. Infelizmente não vou poder contar muito do parque neste post, já que estamos ilhados aqui no restaurante, vendo a chuva cair e aproveitando para adiantar algumas obrigações de viajantes documentaristas que somos.

De Minneapolis fomos para Sioux City, Iowa, uma cidade que fica bem na divisão de três estados - além de Iowa, Nebraska e South Dakota. Eu tenho um brother que, depois de jogar basquete na liga universitária e descolar uma facul na faixa em Nebraska, foi parar lá quando se casou. A esposa, Amanda, é enfermeira e ele trabalha numa empresa transportadora, basicamente resolvendo todo o tipo de pepino que transporte de carga ferroviária pode dar. Eu nunca tinha pensado nisso, mas, depois que ele me explicou, aí é que não entendi nada mesmo. Só aprendi que deve ser um trampo complicado.

No primeiro dia de nossa estadia, o casal nos levou a Omaha, Nebraska, a uma hora e meia de Sioux City. O centro da cidade é bem interessante, com várias construções antigas e lojas descoladas de vinil e arte. Nice place. No dia seguinte, mal saímos de casa. Fomos ali perto comprar a bandeira de Iowa, almoçamos em um buffet chinês e só. Era a chuva começando a atazanar nossa vida, depois da ensolarada Minneapolis.  E era só o começo. No dia seguinte, sábado, levantamos e, sem demora, nos preparamos para partir. O roteiro era simples: dirigir quarenta minutos ao norte, pegar a bandeira de South Dakota e rumar para o Badlands. Seis horas o total da viagem, babinha.

Os primeiros trinta e nove minutos foram deliciosos, o gps nos levou direitinho à rua que buscávamos. Ai, por uma pequena falha no endereço do local onde pegaríamos a bandeira, ao invés de irmos para a direita fomos para a esquerda. BAMM! Empenhados em achar o número da casa, nem notamos uma placa que dizia: "Rodovia com pouca manutenção, dirija por sua conta e risco." Daí em diante foi lama pra tudo quanto é lado. Até a atolada definitiva foram outras quatro atoladas. Quando a gente percebeu que essa última havia sido pra valer, tive que sair atrás de ajuda. Deixei a Bisny sozinha no meio do nada , andei meia milha e voltei à "civilização". Não fui bem recebido. Resolvi voltar para conferenciar com minha partner antes de tomar qualquer decisão. Enquanto andava reparei que o sol estava firme, mandando luz e calor pra gente, transformando o charco em terra. Depois de ligar para o seguro e descobrir que não estamos cobertos para esse tipo de situação, as coisas afunilaram e a saída foi só uma: meter a mão na massa, ou melhor, no barro. Botei o boot no pé, saquei a camisa e comecei sem trégua a tirar com a mão as camadas de lama em volta do pneu; o solzinho continuava brilhando. Tem aquele ditado que diz que é melhor morrer tentando do que morrer pensando. Pois é, de tentar nós alcançamos. Desatolamos do ponto crítico e colocamos o carro no eixo. Sentei ao volante, observei que o solo estava em melhores condições, coloquei el cinturón de seguridad e acelerei, Rali Dacar style. Deu certo. Comemoramos, nos abraçamos, dançamos, fizemos um high five, pegamos a tal bandeira - no lugar certo - e seguimos pro Badlands. 

Chegamos aqui às nove da noite, ainda com luz natural, e montamos a barraca em dois tempos. O colchão de ar, nosso costumeiro desafeto, parecia uma rocha. Tinha tudo para ser uma noitada de paz e descanso. Até começar o vento; 35 milhas por hora é demais pra nossa barraca, ela até aguentou fincada na terra, mas a sensação de tentar dormir assim não é apaziguadora para quem procura pelo embalo do sono no campo. Temendo o desabamento de nosso teto, pegamos nossas coisas de valor e fomos dormir no nosso leito alternativo favorito, o carro. Dessa vez com um pouquinho de lama a mais do que o ideal para o santo repouso. Tive que rir, não há outra coisa a se fazer num momento como esse. O dia alvoreceu e, tendo o vento arrefecido, resolvemos tentar um segundo tempo na barraca. Não vou dizer que a chuva atrapalhou, tampouco vou omitir que acabo de checar a barraca e constatar que os inclementes pingos romperam sua impermeabilidade, alagando-a parcialmente. Tentando sempre enxergar o lado positivo das coisas, Pollyana inveterado que sou, fiquei feliz por poder usar três de nossas toalhas, que até agora estavam estocadas no fundo da mala.

Estamos, desde uma da tarde, sentados no restaurante do hotel do parque, onde almoçamos. Vamos agora emendar o jantar, após uma profícua tarde. Conseguimos três respostas positivas de couchsurfing para os dias que vem chegando, localizamos todos os lugares para pegar as próximas cinco bandeiras e pesquisamos um monte de coisas. Daqui será para Bismarck, North Dakota; de lá para Billings, Montana; então para Wyoming e Idaho, até atingir em quatro dias o Bryce Canyon National Park, em Utah, onde a promessa dos meteorologistas é de sol pleno e abundante, para cozinhar a cuca, dourar a pele e aquecer os bons sentimentos que às vezes ficam congelados dentro da gente.

Falo com vocês em breve, narrando não sei ao certo o quê, na busca incessante de topar no dia de amanhã com uma versão de mim mesmo um pouco mais próxima do que tento ser. Au Revoir!

quarta-feira, 18 de maio de 2011

I Love Minneapolis!




17/05/2011

De Chicago à região dos lagos. Estávamos ansiosos para fazer a road trip em volta do Lago Michigan. Vimos em nosso material de pesquisa que esse passeio tem uma beleza de deixar qualquer um de boca aberta. De fato, que paisagem linda! Cidadezinhas arborizadas e charmosas, no meio do nada, apareciam em meio à vegetação, típica da primavera, mostrando brotinhos de folhas em seus galhos secos... Aquela imensidão de água azul,  que lago! Parecia o oceano, fazendo a linha do horizonte com o céu. Aquela água cristalina, com o fundo de pedra, compôs a paisagem durante um dia todo de viagem. Pena que o frio ainda estava por lá; congelava a mão cada vez que eu queria colocar a câmera pra fora da janela. 

As pessoas são mesmo diferentes, né! Eu estava absorta naquela paisagem, mas não queria ficar fora do carro no ventão frio. Já o Thi, aff... Esse menino é maluco! Acredita que ele entrou no lago??? Eu filmei, tenho provas. Segundo ele, não poderia deixar passar aquela oportunidade de dar um mergulho ali e, além disso, estava querendo uma injeção de adrenalina. Conseguiu! Nunca vi o Thi ligar o ar quente do carro por vontade própria, nesse dia ele o fez. rs

Seguimos viagem até encontrar um camping à beira do lago, queríamos ficar no meio da natureza. Montamos nossa barraca bem mais rápido do que a primeira vez (até porque estava escurecendo); já passamos pra faixa azul! Fizemos tudo em perfeita sintonia, arrumamos uma camona bem quentinha, cheia de cobertores e partimos em busca de um restaurantezinho pra comer... Eu já não vinha boa do estômago há uns dias, e nessa noite dei a cartada final para um mal estar. O único lugar aberto era um mercadinho que vende de tudo e acabamos jantando em pé, em frente ao microondas, comendo sanduíche congelado! Matou a fome, mas acabou com o dia seguinte.

Se o dia seguinte fosse um dia qualquer, tudo bem; mas era nosso aniversário de um ano de namoro!!! Fiquei arrasada. Tínhamos combinado de viajar até Minneapolis, jantar num lugar legal com um bom vinho, passear pela cidade e acabar a noite dançando em algum bar. Mas o que aconteceu foi o seguinte: acordamos com uma chuva daquelas que não passa nunca, olhamos um para o outro e decidimos começar o nosso dia especial dormindo um pouco mais, ao som daquele barulhinho gostoso... Quando ela deu uma trégua, lá pelas onze, saímos da barraca preparados para partir rapidamente, porém, foi só colocar o pé pra fora que a chuva voltou... Bom, a essa altura precisávamos pegar a estrada, então desmontamos tudo embaixo de chuva mesmo.

Fomos buscar a bandeira de Michigan num lugar bem escondido, nos arredores do lago, na casa de um simpático senhor. Nesse ponto já sabíamos que seria impossível chegar em Minneapolis a tempo do jantar, então decidimos pesquisar um outro lugar bacana mais perto e descobrimos Eau Claire, Wisconsin, uma cidade que parecia interessante. Rodamos umas sete horas, ainda vendo o lago em alguns pontos, até que eu desisti. Definitivamente, não me sentia bem; lutei contra aquele mal estar o mais que pude, mas não aguentei. Não ia rolar jantar, vinho e muito menos balada; eu precisava mesmo era de banho e cama. E foi assim que curtimos nosso aniversário: num hotelzinho de beira de estrada, em uma cidade qualquer do Wisconsin. Poderia ter sido um desastre se não fosse a energia maravilhosa do enorme coração do Thi; ele me deixou super calma e cuidou muito de mim! Obrigada, príncipe!

No dia seguinte pegamos nossa caranga e fomos para Minneapolis, finalmente!!! Eba! Aqui arrumamos um couch super legal. Um casal, com um filhinho de um ano e meio, que foi muito ativo no CS durante anos, inclusive ele era embaixador do grupo em Chicago. Depois que tiveram o bebê, nós somos seus primeiros hóspedes... Que sorte! Fomos recebidos com um jantar delicioso e especial. Comemos uma macarronada com cogumelos selvagens, um tipo raro que nasceu no jardim da casa deles. Estava muito bom!

Eu já estava sentindo falta dessa troca boa que acontece quando conhecemos pessoas novas... Conversamos um tempão, sobre tudo, passeamos pelo bairro, pegamos dicas da cidade para o dia seguinte e dormimos num quarto só nosso! Pena que o colchão de ar ficou mole de novo... Ah! Que coisa difícil de funcionar bem. 

Ontem o dia amanheceu lindo, com muito sol. Não era um calorzão, mas estava agradável. Fomos andar de bike no lago Calhoun. Ps: essa cidade é considerada a mais amiga dos ciclistas nos EUA. Tem ciclovia em TODO lugar; o negócio é fantástico. As pessoas se locomovem de bicicleta para tudo; você sobe e desce pontes exclusivas para ciclistas e pedestres, atravessa dezenas de parques em uma pedalada de dez quilômetros, tem verde por toda parte, é incrível! 

Passamos o dia todo ao redor do lago, o Thi arrumou minha bicicleta que quebrou mais uma vez, pedalamos, fizemos yoga, tiramos várias fotos e comemos o melhor lanche de peixe no pão de cachorro quente do mundo! Valeu esperar meia hora na fila. À noite curtimos uma fogueira com lua cheia no quintal. Nós, a Vonnie e o Justin; isso é muito legal, sorte deles que deixaram Chicago para trás!

A bandeira de Minnesota foi uma surpresa. O Justin achou numa loja sei lá onde, enquanto trabalhava. Ele nos ligou para saber se queríamos que ele comprasse... Claro que sim! Essa foi demais!

Com a missão da bandeira cumprida, hoje o dia foi só alegria! Pedalamos pela cidade toda, uns 15 km! (tô que não me aguento de cansaço... rs). Fizemos o roteiro completo que eles haviam nos indicado. Vimos os lagos, atravessamos várias pontes, visitamos o jardim das esculturas, comemos no café do museu Walker Art, andamos de bike por downtown, passamos pelo Water Park, cruzamos alguns parques, fomos ver a cachoeira, praticamos yoga em frente ao coreto, pegamos um trem com as bikes e tudo e encerramos nosso passeio com um jantarzinho delícia num restaurante tailandês, em frente ao Guthrie Theater. 

Posso dizer com toda a certeza: essa é minha cidade favorita até agora! Passou Austin, que é sensacional, e era minha predileta. Mas Minneapolis tem uma vida diferente, uma paisagem exuberante e esssa qualidade de vida tão desejada. Essa cidade é demais! No verão, claro. No inverno eu tô fora, o frio dura uns oito meses e chega a fazer -40. Não dá pra ser perfeito, né? Ainda bem que passamos por aqui nos dias certos; era mesmo pra marcar nossas memórias! Aliás, não só a cidade vai deixar saudade; Vonnie, Justin e Hank, esse bebê sorridente com uma covinha linda, também estarão para sempre em nossas melhores lembranças.

Dias como esses me fazem querer viver assim eternamente... Ainda bem que amanhã tem mais!


sexta-feira, 13 de maio de 2011

Bulls com lasanha





12/05/2011

De barriga cheia, após - sem exagero - comer uma das melhores lasanhas de minha vida, ainda sentado no restaurante, começo a rabiscar este relato. Estamos em Elkhart, Indiana, e entramos nessa cantina por acaso; nem é assim um lugar tão bacana, só paramos aqui pra não ter que comer fastfood na estrada. Valeu a pena! Menção honrosa feita ao Da Vinci's, vamos aos fatos dos últimos dias.

Da peça na prisão em NY, após uma dormidela no carro em uma área de descanso na própria rodovia, tocamos para Willoughby, Ohio, na intenção de garantir nossa bandeira de número 27. Foi um sábado muita agradável, numa cidade daquelas bem tranquilas e arborizadas, com direito a passeio de bike e namorico adolescente na redondeza bucólica. Show! Nosso próximo destino seria Chicago e, dessa vez, nem idéia de onde ficaríamos. Foi ai que algo me ocorreu. Eu já tinha ouvido falar do priceline, um site que oferece promoções para vôos, restaurantes, hotéis etc. No caso dos hotéis, existe uma ferramenta que deixa você escolher quanto quer pagar. Funciona assim, você seleciona a localização de onde quer ficar (Chicago, por exemplo, é subdividida em umas dez localizações), define a categoria do hotel e dá "um lance" da quantia que quer desembolsar pela noite. Na nossa negociação, o hotel três estrelas perto do aeroporto saiu por $50,00 a diária, sendo que a tarifa normal desse hotel é $149,00. Foi um belo deal. 

A gente optou pela rede hoteleira para tirar umas pequenas férias do couchsurfing. Sabe como é, estávamos querendo um tempinho só pra nós dois. Não que estar com as pessoas que nos recebem de alguma maneira nos incomode, muito pelo contrário, mas é que a gente precisava demais, pelo menos por uns dias, ter total privacidade; não só a título conjugal, mas também para fazermos um balanço com calma de tudo que aconteceu até agora, o quanto e como avançamos e onde queremos chegar. E foi um sucesso, essa Chicago private no aconchegantérrimo Hampton Inn, em Midway Airport, nos proporcionou imensuráveis ganhos.

Uma coisa engraçada é que viajar assim é totalmente diferente do que viajar de férias. Se a gente tivesse vindo para Chicago passar quatro dias num feriado, com certeza teríamos visto muito mais. Só que a gente teve que trocar o carro na locadora, ir ao correio, ir ao banco... E olha que essa city tem trânsito, viu?! Mas também deu tempo de ir à United Center Arena, presenciar Dereck Rose e cia colocarem o Chicago Bulls a um passo das finais da conferência Leste. Meu maior ídolo de infância foi Michael Jordan, eu cresci assistindo jogos de basquete, às sextas-feiras à noite, na Band. Estar lá, vendo de perto uma coisa que marcou muito minha infância, foi muito mais do que apenas assistir a mais um de muitos eventos que a indústria do entretenimento produz aqui neste país. Foi a realização de um sonho que eu sempre tive. Dereck Rose não é Michael Jordan e eu não tenho mais doze anos, mas valeu mesmo, fiquei feliz demais. Ainda mais porque levei a minha própria cheerleader, que dança tudo que as gringas dançam e ainda apavora no samba. Requebra, Bisnaga!! Let's go Bulls!!

De Chicago é isso, Illinois ficou para trás, estamos em Indiana, a caminho de Michigan, Wisconsin e Minesota, nesta ordem. Sábado estaremos em Minneapolis, comemorando nosso primeiro aniversário de namoro. Um ano com essa coisa tetéia delícia que é minha sereia. Mas disso a gente fala depois, fornecendo em primeira mão os detalhes não-censurados desse grande acontecimento. É isso ai, a lasanha já foi digerida e a estrada nos conclama. WEST IS GETTING CLOSER AND SOON IS GONNA BE SUMMER, BABY!

terça-feira, 10 de maio de 2011

Por trás das grades


10/05/2011


Hey guys, como estão?

Não sei se isso é pergunta que se faça para vocês, mas espero que estejam bem e ainda com aqueles sorrisos estampados no rosto. Quer dizer que irão repetir a apresentação da peça Bullpen? E dessa vez a plateia será grande, hein!! Fico feliz por vocês; sou atriz e sei como é boa a sensação de estar ali na frente, de interpretar com paixão e ser aplaudida. É bom demais! Especialmente depois de meses de ensaio...

Soube que trabalharam duro desde setembro do ano passado, depois que permitiram que vocês ensaiassem nove horas por semana. E que a turma era tão boa que, logo no segundo encontro, todos já tinham o texto na ponta da língua. Valeu a dedicação, vocês me emocionaram! Além das maravilhosas interpretações e do roteiro intenso e divertido do Dennis, ainda fui pega por meus próprios e conflituosos pensamentos... Estava ansiosa para assistir essa peça desde que o dia amanheceu... Dirigimos umas sete horas, numa corrida contra o tempo, de Burlington, VT, até Woodbourne, NY.

Quando chegamos, reparei como a penitenciária, logo por fora, é diferente das que já vi no Brasil. Na entrada tivemos que mostrar os documentos, assinar uma lista e passar por aquela máquina de raio X; depois de tirarmos os sapatos, o cinto, o colar e a jaqueta, eles carimbaram nossas mãos। O Dennis estava ali na entrada com a Caroline e os outros integrantes desse projeto maravilhoso - RTA (Rehabilitation Through the Arts). Todos simpáticos e ansiosos. Eles logo reconheceram a gente: "Você é o Thiago?!" - disse a Caroline. E assim nos enturmamos; ficamos por ali uma hora trocando ideias e esperando o grande momento.

Nesse bate papo descobrimos que existem 2,5 milhões de detentos nos EUA; setenta penitenciárias só no estado de NY; que nessa aqui há um número de aproximadamente 800 presos, que se dividem em celas de 20 lugares, certo? Soubemos também que cada um tem sua cama e um armarinho... E que o RTA tem sido um sucesso! Tem até aula de dança contemporânea e essa apresentação é outra que eu gostaria de ver. Gostei de saber que são vocês mesmos que decidem quem pode participar das atividades propostas. Isso é bacana porque garante a integridade dos trabalhos. E ninguém melhor do que vocês pra saber quem tá levando a sério e quem só quer causar, né?

O Dennis e o RTA fizeram esse trabalho tão bem feito que até o comissário, responsável por todas as prisões de NY, foi prestigiar vocês. E mais: acompanhado da esposa. Que moral! Bom, mas o Dennis merece... Um cara que cresceu num ambiente pouco saudável, foi preso, usuário de drogas e escapou - por bondade de um policial - de pegar uma pena longa, como as que boa parte de vocês está cumprindo; foi mandado pelo pai de um amigo a uma boa escola onde descobriu o cinema, se reabilitou, ganhou prêmios e escreveu esse ótimo roteiro, que em sua primeira montagem teve em seu cast atores como Denzel Washington e Bruce Willis, ambos no começo de suas carreiras. E agora, repetindo a dose, encarou com paixão a montagem dessa peça aqui. Ah, ele merece até a presença do Obama!

Pelo que ouvimos ali no saguão, a princípio o pessoal da diretoria não curtiu muito o roteiro, porque tinha muitos palavrões e referências à realidade de vocês. Mas ele não recuou, manteve o roteiro do seu jeito. Boa, Dennis! O negócio deu tão certo que já mudaram de ideia. Como eu disse, todos os detentos assistirão vocês em cena!

Quando chamaram a gente para entrar, eu senti na pele o que é estar numa cadeia, e olha que eu estava aí como VIP... Os guardas nos guiavam até um portão, abriam, esperavam o primeiro grupo entrar, fechavam o portão... Ficávamos presos entre dois portões até que o próximo se abrisse... E assim passamos por uns três ou quatro até chegarmos ao espaço da apresentação. Mais tarde fiquei sabendo que foi a primeira vez que muitos de vocês foram àquele espaço, onde acontecem as visitas com familiares e crianças. Fiquei triste pelos que nunca recebem visita alguma... Surpreendente como vocês se ambientaram rápido a um espaço onde nunca tinham ensiado. Tenho que admitir que, a partir do momento em que entrei naquela sala, minha mente e meu coração viraram um vulcão em erupção। Vocês nos receberam super bem, com apertos de mão e sorrisos sinceros. Todos bem arrumados, cabelos bem penteados e cheirosos em seus uniformes verdes. O Thi falou assim: "Quero abraçar esses caras!" E essa era mesmo a nossa sensação; uma mistura de compaixão e curiosidade.

Aí eu me peguei pensando: "Tá, Chris, você está super confortável aqui, mas se você não tivesse todas as excelentes recomendações feitas pela Estela (mãe do Thiago) sobre esse trabalho do Dennis, será que você estaria à vontade no meio de cinquenta detentos? Será que você ia querer abraçá-los? Afinal, se eles estão aqui, presos, é porque fizeram algo de errado..." Não fiquem chateados comigo, por favor, tentem olhar pelo meu ponto de vista.

Um de vocês chamou minha atenção com uma polaroid, ele levantava com pose de fotógrafo que não quer atrapalhar o show e registrava o espetáculo. Não resisti, sorri pra ele e disse: "That's cool man!" E ele, orgulhoso, respondeu que aquela era antiga... Com um sorrisão, é claro. Outro colega me fazia rir de tanto que ria das cenas engraçadas, de fato cenas muito boas. Eu olhava pra ele e ficava feliz por vê-lo tendo aquele momento de entretenimento, envolvido com a história que conhece de perto. Aliás, toda a plateia se divertiu e se emocionou com a apresentação.

Dava pra sentir a vibração que vinha do "palco"; a dedicação, o envolvimento e o comprometimento de cada um. Os personagens nos prendiam a atenção, não houve espaço para distração. O ritmo e roteiro eram excelentes! Num determinado momento, depois que vocês estavam em cena há mais de uma hora, pensei: "Será que eles poderão tomar banho depois da peça, caso queiram?" Porque eu sei que a gente transpira ali na frente... Isso me levou a outros pensamentos, me tirou do teatro e me levou à cadeia novamente. Que tristeza! Foi assim até o final, fantasia e realidade me chacoalhando o tempo todo. Ao final do show, queria aplaudir de pé, assoviar e gritar: BRAVO! Mas me contive em inúmeras sequências de palmas. Que trabalho lindo vocês realizaram. Parabéns!

O grand finale não poderia ter sido melhor. Em seu discurso final, nosso herói Dennis deu a deixa que todos queríamos: "Agora vocês podem cumprimentar o grupo aqui na frente". Uuuhuu, aí sim: "Vamos nos aproximar e conhecer mais sobre essas figuras enjauladas e misteriosas"... Trocamos abraços, apertos de mão, milhares de elogios, fizemos e respondemos perguntas... Conversamos o máximo que conseguimos com cada um de vocês nos 25 minutos que nos foram concedidos pelos guardas. A gente queria mais, mas entendemos a euforia ao final do espetáculo... Todo mundo quer cumprimentar, tirar foto, conversar... É tietagem pura e merecida! Fiquei triste porque nossa foto não rolou, Speed. Queria muito que tivéssemos esse registro... Valeu pelo esforço, nós vimos o quanto você também queria a nossa polaroid, mas não deu tempo, eles mandaram a gente sair... Pode ter certeza que essa experiência ficará guardada em nossas memórias para sempre.

Tenho que contar pra vocês que saí daí com um nó na garganta; queria que todos vocês também pudessem ir pra casa, ou nos acompanhar num café... Sei que muitos estão cumprindo prisão perpétua e que outros ainda têm longos anos de clausura. Mas saibam que é admirável a conduta de vocês e, mesmo nessas condições, trabalharem em prol da evolução pessoal. Vocês são caras do bem! Depois que todos aqueles portões se fecharam atrás de nós, fomos tomar um café com o digníssimo diretor Dennis, sua companheira e produtora desse impecável espetáculo, Caroline, e dois amigos. Conversamos um pouco sobre a história do próprio Dennis, de onde surgiu esse roteiro, das dificuldades que enfrentaram para produzir essa peça, dos elogios que receberam dos guardas, de como o sistema se preocupou com a presença dele, achando que ele poderia estar criando um movimento de rebelião e outros detalhes mais. Falamos também um pouco sobre vocês, estávamos curiosos pela história pessoal de cada um, ficamos surpresos ao descobrir que a maioria cometeu assassinato e que cumprem pena média de 25 anos. Eles nos contaram da boa conduta desse grupo, da busca pela reabilitação e das personalidades cativantes que se revelaram durante esse trabalho. Nos tocou a história de um de vocês que assumiu a culpa pelo irmão, por ser menor de idade na época e ter a chance de pegar uma pena mais suave, e acabou pegando uma de 25 anos... Espero que seu irmão te visite sempre e que você não perca a bondade, jamais. Tivemos uma idéia do cenário no qual vocês estavam inseridos quando cometeram os delitos... Uma New York violenta e marginalizada... Não que isso justifique, mas explica muita coisa. Tive também a resposta em relação ao banho e soube que, além de não poderem tomá-lo, ainda tiveram que passar por uma revista, nus, como de costume.

Nos revolta o senso de justiça mundial... Alguém é pego com uma quantidade grande de cocaína e cumpre pena de mais de vinte anos. Outros desfrutam do dobro dessa quantidade em festas e estão livres, só planejando o outro grande evento comemorativo... Gostaria de saber mais sobre vocês, escutar suas histórias e quem sabe um dia trabalharmos juntos em um novo projeto! Fiquei mesmo com vontade de ampliar esse círculo do RTA. No Brasil o sistema penitenciário é bem diferente, pra pior, infelizmente, mas nada é impossível. Vocês acabaram de provar isso.

Essa experiência deixou meu peito borbulhando de sensações dúbias... Levei aquele nó na garganta por mais três ou quatro horas de estrada; até que paramos num rest area para dormir (no carro mesmo) e eu desabei. Chorei toda aquela emoção e desejei, emanando meus melhores pensamentos, que vocês tivessem uma boa noite de sono. Que mantivessem os corações cheio de alegria e esperança, pois vimos que é possível encontrar a felicidade!

Obrigada pelo lindo show. Foi um prazer enorme conhecê-los. Fiquem em paz e continuem trabalhando com tamanha dedicação, vocês são grandes artistas. Parabéns, mais um vez, a todos!

Mais fotos:
http://www.facebook.com/pages/FiftyFlags/147629978630115

domingo, 8 de maio de 2011

Lets Burn it All



08/05/2011

Começo a escrever agora de um quarto de hotel em Chicago. Desde o último domingo, dia em que pela última vez este blog foi atualizado, passamos por uma semana intensa, de descobertas, desenlaces e grandes decisões. Fomos levados, pelos loucos caminhos que a nossa viagem nos descortina, a encontrar algumas respostas que estávamos procurando. Isso só me faz acreditar mais e mais que as coisas acontecem de acordo com a intenção e a fé que a gente coloca antes delas se materializarem. Como isso ocorre não sei responder, só sei que creio piamente não haver obstáculo que possa se interpor de maneira intransponível na trajetória de alguém que persegue com tenacidade algum objetivo ou sonho. "Não sabendo que era impossível, foi lá e fez..." - disse uma vez algum sábio. E acreditando que assim seja, eu e minha sereia temos ousados projetos para o começo de setembro. Vamos por partes.

Segunda-feira passada deixamos o nosso sofá em Walthan, Massachusetts, e fomos aproveitar o dia em Boston. Nosso plano era passar aquela noite em outra cidade ali perto, na costa do estado. Acontece que o nosso host deu pra trás no último minuto, alegando ter seus motivos; penso que o maior motivo de todos era a necessidade de, naquela noite, a Bisny e eu irmos para Portland, ME. Como era muito tarde para fazer uma pesquisa mais detalhada no couchsurfing, usei de uma estratégia mais abrangente: me filiei ao grupo couchsurfer da cidade de Portland e deixei uma mensagem comunicando que estaríamos chegando na cidade em um par de horas, mesmo não tendo onde ficar; acrescentei que, como não haveria tempo para troca de mensagens por internet, se alguém se interessasse em hospedar o casal mais cool da America, era só give a call to my number - nice and easy. Mal havíamos saído de Boston e nosso celular recebia uma ligação de Claudia Laguardia. 

Claudia é uma descendente de guatemaltecos, estudante de filosofia e trapezista que mora com o namorado (que está de viagem pelo país divulgando seu projeto de energias renováveis), os sogros e cachorros e gatos da família, em Scaraborough, cidadela ao lado de Portland. Ela não pode simplesmente receber couchsurfers na casa sem a anuência dos sogros, que, até então, nem sabiam direito da existência dessa rede de relacionamentos onde fulano dorme na casa de cicrano que não conhece. Entretanto, sendo uma guria de mente aberta, resolveu perguntar - porque não ofende. Democratas do Maine, o simpático casal abriu a porta de sua casa para os viajantes brasileiros. Chegamos lá e fomos recebidos pela pequena menina de quando muito um metro e meio (a tampinha da Bisny fica uma mulher de altura mediana perto dela), que fala baixinho, tem um olhar distraído e logo me pediu ajuda para instalar um trapézio nas vigas do teto do porão. A nossa passagem pelo Maine começou assim, com aulas de circo. Das práticas passamos às conversas, do bate papo chegamos rapidamente ao rascunho do que será o encerramento do projeto FiftyFlags. Construíremos no Burningman (wwwburningman.com) um dome, que servirá como espaço de livre manifestação artística e confraternização, entre todas as pessoas que, de alguma forma, participaram de nossa epopéia ou que quiserem se aprochegar. A Claudia já esteve no Burningman, tá dentro dessa com a gente e vai pendurar seu trapézio no topo da nossa instalação. Se alguém aí tiver alguma ideia ou quiser aparecer... Mi casa es su casa. 

Na verdade a gente foi para Portland e não para o Acadia National Park, mais ao norte de Maine, porque a previsão do tempo era de chuva incessante. Mas depois de dois dias com a Claudia resolvemos dirigir até Bar Harbor, a cidade que fica ao lado do parque. Fomos no mesmo esquema, sem ter onde ficar e sabendo que não haveria condição climática para a prática do camping, com o agravante que o couchsurfing praticamente inexiste na cidade. Mais uma vez tudo se resolveu no último segundo, mais uma vez o pacote saiu melhor do que a encomenda. Chegando perto de Bar Harbor, recebemos um telefonema da Claudia dizendo que poderíamos ficar na casa de uma amiga dela por lá. Liguei para a amiga e descobri que, na verdade, ficaríamos na casa de outra amiga. Liguei para a outra amiga e anotei o endereço. Uma hora depois entrávamos na comunidade social democrata encabeçada pelo sexagenário casal Robert e Diana. Funciona assim: naquela residência labiríntica há espaço para acomodar em torno de 10 pessoas. Por aprovação unânime - e só assim -, após pelo menos uma semana de experiência, a pessoa pode se tornar um membro residente da "família". Bar Harbor é uma cidade onde grandes redes, sejam de fastfood, material de construção ou indústria têxtil, não entram. Os moradores não aprovam, se mobilizam e boicotam se alguma se atrever. 

Na comuna de Robert ninguém é obrigado a nada, limpa quem quer, contribuí quem quer e com o que quiser, tudo na base da livre cooperação; e assim funciona a engrenagem da vida em grupo. Todas as quartas-feiras, exatamente o dia em que passávamos por lá, acontece um jantar, onde todos sentam à mesa juntos. Quem quiser prepara um prato e apresenta sua criação gastronômica antes da comilança ter início. Nesse dia só tinha comida saudável, mas o jantar primou mesmo pela boa conversa e pelo sentimento de união daqueles que dividiam o alimento e os pensamentos. Todos estavam muitos entusiasmados com a nossa presença e queriam saber de tudo sobre nossa viagem e nosso país de origem. Terminada a refeição, fomos ao quarto de um casal cubano para assistir uns videos de dança e seguir com a conversa. Pouco a pouco os moradores da casa, quase todos jovens estudantes, foram aparecendo. O resultado disso foi música (Grande Max!), risada e muito aprendizado. A troca - de informações, de camaradagem, de sorrisos, de afeto - foi uma coisa que realmente nos tocou, saímos de lá emocionados e ficamos ainda mais tocados ao ver a cama que a Diana montou para a gente na sala, com lençóis cheirosos e um pano improvisado tapando o vão que dá para a cozinha, prezando pela nossa privacidade. Adormecemos agarrados e gratos por encontrar gente assim, fomos viajar em nossos sonhos pensando no quanto nos sentimos no dever de retribuir de alguma forma todos os presentes que temos recebido nessa viagem.

Antes de chegar em Burlington, Vermont, com direito à passagem relâmpago por New Hampshire para pegar nossa bandeirola, eu só queria registrar o outro exemplo que tivemos de vida em comunidade. Além deste que nos agradou muito em Bar Harbor, tivemos a oportunidade de observar o modelo de vida em comunidade mais promíscuo e insalubre dos últimos tempos. Logo na chegada, ao estacionar o carro, fomos "agraciados" com a visão de uma balzaquiana com as mamas nuas batendo no umbigo, ao balanço do rebolado de seu corpo desconjuntado manobrando um bambolê vermelho. A tal em questão, uma das moradoras dessa casa, cria sua filha pequena no meio do ambiente libertino que vou descrever. Na cozinha a personagem principal era uma moça em seus 130 quilos se auto tatuando na coxa mais do que roliça; no aquário, ao invés de peixinhos dourados, uma ratazana estilo New York subway. No único quarto, provavelmente coabitado por meia dúzia de seres além da infante, não havia espaço para se colocar a ponta do pé no chão, tal a mistura de brinquedos, roupas e detritos que se amontoavam nele. Enfim, não pude conhecer essas pessoas a fundo e não quero julgar ninguém, mas para mim ficou clara a diferença de um ambiente onde a liberdade e cooperação se sobressaem, e o outro onde a descontrolada anarquia deforma o aspecto e a energia das pessoas. Foi intensa a nossa curta estada nessa casa, acho que até a própria Claudia sentiu que estávamos desconcertados. Doidera demais!

Em Bar Harbor, um dos garotos que conhecemos foi o James, completamente louco varrido, que está fazendo mais ou menos a mesma coisa que a gente, só que de bicicleta. Ele é gente fina demais, consertou o pneu da bike da Bisny que estava prejudicado e arrumou um lugar pra gente ficar em Burlington, VT, nossa próxima parada. Como em Bar Harbor, só ficamos sabendo no caminho que teríamos onde pernoitar. O James conectou uns amigos universitários que moram em um dormitório em Burlington. Como o ano letivo deles terminou essa semana, das 34 pessoas que moram no dormitório apenas 4 estavam lá. A molecada entre 19 e 20 anos nos recebeu muito bem, em meio a uma bebedeira e sessões indoor de skate. Todos foram contaminados pelo "ideal" FiftyFlags, talvez algum deles dê as caras no Burningman. Burlington é uma cidade bem bonita às margens do lago Champlain, não fosse a pressa e o frio poderíamos ter aproveitado mais. Mas, nem que ladrem os cães, a caravana não pode parar. De lá dirigimos até a Woodbourne Correctional Facility, em NY, para assistir a uma peça encenada pelos próprios detentos. Sexta-feira, 5:30 da tarde, e a nossa semana terminaria com um soco no estômago. Ainda bem que a vida às vezes bate forte. A Bisny vai contar da peça no próximo post. See you in the Black Rock Desert.

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segunda-feira, 2 de maio de 2011

Magic FiftyFlags



01/05/2011

Estou vivendo num parque de diversão... Tem montanha-russa que dá frio na barriga, tem casa do terror, ou melhor, dos punks, tem montanha encantada com surpresas e curiosidades a cada curva do rio, carrossel com passeios românticos... Aqui tem de tudo!

Na Virginia curtimos uma estadia familiar, cuidados com muito zelo e conforto. Ficamos na casa de um casal amigo da mãe do Thi, tivemos café da manhã preparado com carinho e bom papo, e dois jantares maravilhosos, além de ganharmos de presente a nossa vigésima bandeira! Susan e Peter, muito obrigada; vocês foram nosso "algodão doce"... rs

Aliás, preciso falar sobre as flores de Arlington... Gente, o que é aquilo?! Azaleias coloridas por todo o canto, são mais de 300 tipos - segundo o Peter nos contou -, muitas árvores floridas e gramados verdinhos. Que lindo jardim!

Mas o ponto alto desse trecho foi mesmo o Thi; com seu macacão colorido ele arrancou sorrisos e deixou sua mensagem de paz!... Acho que foi isso que me fez sentir em um universo de magia... Como é que uma simples roupa pode mexer tanto com a gente? Eu fiquei pensando que, se todos nós usássemos vestimentas diferentes, poderíamos gerar um movimento social, poderíamos escolher qual mensagem passar e, juntos, fazer isso acontecer! Caso decidíssemos transmitir alegria, seríamos capazes de conseguir muitos sorrisos... Já pensou???

Aí eu concluí que sim, isso é possível; assim como faz o grupo Improv Everywhere (http://improveverywhere.com). Mas além da roupa é preciso "ser alguém com luz" suficiente para emanar tal mensagem, senão vira um palhaço de farol que passa desapercebido... E o Thiago tem essa luz! Vocês precisavam ver o que ele causou nos museus que visitamos... Os adolescentes piraram nele... Pediam pra tirar foto junto, perguntavam onde ele arrumou aquele macacão, por que estava vestido assim, de onde ele era, e tal. Alguns queriam abraçá-lo, outros sorriam largamente... Teve um garoto que disse: "Você me transmite paz, cara!". Um outro fez três perguntas e, ao ouvir que éramos do Brasil, arregalou os olhos e saiu andando; até agora estou encafifada com o que passou na cabecinha dele... Um grupo enorme que fez roda em volta do Thi saiu gritando de euforia: "Eles são do Brasil! São do Brasil!". Que loucura incrível de se viver!!

Como observadora, fiquei maravilhada... Como o ser humano é rico em expressões e emoções... O jovem é curioso, destemido, se faz mais importante no grupo quando tem coragem de abordar alguém desconhecido; as crianças são livres, apontam, sorriem, tocam... Já os adultos, cheios de máscaras protetoras e sociais, ou os tímidos, tentam sorrir sem mostrar os dentes, disfarçam o foco de suas câmeras fotográficas para registrar aquela pessoa que está chamando sua atenção, cutucam uns aos outros "disfarçadamente", sentem vergonha alheia por aquele que não tem vergonha nenhuma! 

Quando a gente estava na frente da Casa Branca um guarda pediu para tirar uma foto do Thi, ele quer colocá-la no Facebook. Depois, ficou parado assistindo nossa gravação de um pedido de PAZ ao Obama. Por fim, queria saber o que tínhamos dito e sorriu mais uma vez apertando a mão do Thi. A moça que andava na rua também sentiu necessidade de parabenizar nosso herói, já que ela admirou e curtiu sua atitude!

Esse planetário humano fez meu dia, com certeza evoluímos como pessoas depois de vivermos essa experiência. Para quem está agora com o sorrisinho preso nos lábios eu diria: VAI EM FRENTE!

Mais uma longa caminhada pelas estradas norte-americanas e chegamos à casa de um casal interessante em New Haven: estudantes da Yale e organizadores de jantares que reúnem pessoas que querem conhecer novas pessoas -  detalhe para as etiquetas com o nome na blusa de cada um dos convidados.

Ela criou uma ONG para manter viva a história das famílias que passaram pelo genocídio ocorrido no Camboja (ela mesma passou por isso). Foi premiada por seu documentário "New Year Baby and Socheata Poeuv" e faz agora um MBA em business. Ele, soldado da paz, cinéfilo e estudante de religião e ética, enche o peito para falar, sempre com firmeza e rapidez, de suas experiências. Nossa passagem nesse couch foi rápida, apenas uma noite, mas valeu! Downtown é muito charmosa, com uma belíssima arquitetura e o Starbucks lotado de estudantes em plena noite de sexta-feira.

Agora estamos em Massachusetts, pertinho de Boston, já pegamos as bandeiras em Connecticut e Rhode Island, em um daqueles dias de passagem rápida... Como um trenzinho que te leva de um lugar ao outro com um belo passeio pelo parque... Por aqui o frio ainda não foi embora totalmente, o que nos dá uma saudadezinha dos bons tempos em New York... Ah! Esqueci de dizer: no caminho pra cá passamos pelo meio de NYC!! Bem perto da casa em que morávamos, no Brooklyn. Foi muito bom, inesperado, ficamos cheios de boas lembranças e saudade, afinal foi ali que tudo isso começou... 

Mas parar, nem pensar! Vamos em frente que ainda quero curtir muitos brinquedos desse parque.

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